Recentemente, o Senado francês aprovou uma lei pioneira que restringe o crescimento da chamada ultra-fast fashion, especialmente plataformas online asiáticas que fizeram sucesso crescente nos últimos anos. A proposta já havia sido aprovada em 2024 pela Assembleia, mas a versão final criou uma distinção clara entre “ultra-fast” e fast fashion “clássico”, sendo que somente os primeiros recebem restrições mais duras. Entenda essa diferença e como esta lei deve impactar o futuro da moda e seu futuro mais sustentável.
Propósito fashion + sustentabilidade
A nova legislação impõe taxas ambientais por peça vendida, chegando a €5 por item, com incremento até €10 até 2030, ou até 50% do valor do produto. O objetivo? Desincentivar o consumo desenfreado e ressarcir parte do impacto ecológico causado por peças de custo quase simbólico.
Além disso, a lei proíbe a publicidade de marcas ultra-fast fashion a partir de 2025, exigindo também que sites exibam informações claras sobre impacto ambiental dos produtos. A multa pode ser alta — até €100 mil por infração.
No que diz respeito ao ultra-fast fashion, a lei reconhece principalmente as lojas online asiáticas que colocam em suas roupas um baixo preço. Já as fast fashion, que não serão taxadas dessa maneira, são as empresas que possuem lojas físicas e uma fiscalização maior de sua produção.
A indústria no espelho
A indústria têxtil é responsável por cerca de 10% das emissões globais de CO₂ e polui 20% da água potável do planeta, segundo dados do governo francês. A Chambre Nationale de l’Habillement destaca que essas medidas resgatam competitividade para negócios locais prejudicados pela avalanche de produtos ultra-baratos.
O texto teve votação unânime na Assembleia, uma demonstração de consenso nacional, e passou ao Senado para implementação nos próximos meses. Cá dentro, ouviu-se críticas quanto ao tratamento diferenciado dado a marcas como Zara e H&M, consideradas fast fashion “menos agressivas” no comparativo, além de preocupações sobre o impacto nos consumidores de baixa renda e nas pequenas empresas.
A China reagiu. A Shein, por exemplo, argumentou que seus modelos são mais sustentáveis do que parecem e chegou a investir em lobby pesado na França, contratando ex-políticos e divulgando campanhas de imagem, em um esforço para mudar a percepção pública.
Um movimento global: a França será o exemplo a ser seguido?
Diversos países ao redor do mundo têm adotado medidas concretas para conter os impactos ambientais da fast fashion, reforçando um movimento global em prol de uma indústria da moda mais sustentável. Na Suécia, por exemplo, o governo reduziu impostos para serviços de conserto de roupas, incentivando a população a optar por reparar ao invés de descartar peças, além de se posicionar de forma ativa nos debates da União Europeia sobre consumo consciente.
Na Espanha, uma lei de resíduos proíbe o descarte de roupas não vendidas, obrigando as empresas a direcionar essas peças para reciclagem, doação ou reaproveitamento. Já o Reino Unido, após denúncias graves contra marcas como a Boohoo, passou a discutir a responsabilização legal das marcas por suas cadeias de produção e propôs a criação de selos que informem o impacto ambiental das peças.
A Austrália também avançou com a implementação de um programa nacional que pretende reduzir em 20% o impacto ambiental do setor têxtil até 2030, com foco em design sustentável e economia circular. No plano coletivo, a União Europeia lançou em 2022 uma estratégia ambiciosa que visa tornar todos os produtos têxteis vendidos no bloco recicláveis, duráveis e livres de substâncias tóxicas, além de estabelecer diretrizes para combater o greenwashing.
Moda e consumo com propósito
Com essa lei, a França se posiciona como pioneira no enfrentamento ao modelo ultraconsumista da moda. A indústria — especialmente no segmento fast fashion — é desafiada a ser mais transparente, responsável e menos descartável. E o público, por sua vez, é convidado a repensar seus hábitos de consumo.